O Cavalo Babão

Fiz essa foto do Cavalo Babão (ou Fonte da Memória) do Largo da Ordem e buscando referências na web, achei um excelente texto do colunista José Carlos Fernandes publicado na Gazeta do Povo de 04 de abril de 2008, que estou reproduzindo na íntegra abaixo. Se o texto permanecer no blog é porque o colunista permitiu ou não percebeu que teve sua coluna replicada nesse modesto espaço.

“Es hermoso. Muy lindo. E jorra água pela boca. Em Montevidéu não tiene igual”, desmancha-se a enfermeira uruguaia Níbia Silva, 52 anos, num portunhol de cristaleira, diante da mais popular obra pública de Curitiba – o “Cavalo Babão”. Não adianta espernear. A fama do monumento pode ser comprovada numericamente. Num único domingo, o “Babão” é visto por nada menos do que 18 mil passantes, público médio da Feirinha do Largo da Ordem, com a qual a obra se confunde.
Não se trata de uma visita intencional, é verdade, mas que ajuda a aumentar a popularidade, ajuda. Aliás, nenhuma das 240 esculturas de praças de Curitiba goza de tamanho privilégio. O mesmo se diga de espaços de arte em geral. A administração do Museu Oscar Niemeyer, por exemplo, precisa ralar um mês para atrair 15 mil pessoas – o que é fichinha para o Babão. Resta saber das razões de tanto afeto.

Uma das explicações é geográfica. A “Fonte da Memória” – nome oficial da obra criada pelo escultor Ricardo Tod, morto prematuramente em 2005, aos 42 anos, num acidente de carro na BR-116 – tem como vizinhos ilustres a Igreja do Rosário, a Sociedade Garibaldi, o Relógio das Flores, o Palacete Wolf, o Solar do Rosário e a Igreja Presbiteriana Independente. Desde 1995, quando o bronze foi instalado, como que por encanto virou ponto de referência, deixando os marcos históricos na arquibancada. Um lugar fica antes ou depois, perto ou longe, para cima ou para baixo do “Cavalo Babão”. E fim de papo.

Há também razões de ordem afetiva. Basta conferir o que se fala do cavalo em pelo menos 180 endereços da internet, muitos deles blogs de jovens que relatam sua cumplicidade com o logradouro. Nas madrugadas frias do Largo da Ordem, sem um Engov à mão, não é difícil imaginar o encontro alucinante com um cavalão de dois metros de altura e 15 toneladas, mas que também regurgita como um reles mortal. Há blogueiros que chegam a recomendar: em caso de súbito mal-estar, recorra às águas da fonte. Muy triste!

Não é tudo. “Fonte da Memória” ganhou os braços do povo pela força de sua plástica. Os dentes à mostra, a boca aberta e olhar de fúria são tão familiares que não raro alguém esbraveja um curto e grosso “não me olhe com essa cara de cavalo babão.” Sem falar na baba, essa intratável. Quem é que não teve na vida pelo menos um dia de babão? O meu foi aos 12 anos, durante uma aula de datilografia: a, s, d, f, g. Ops! Tarde demais.

Tudo isso é para dizer que o “Cavalo Babão” tem uma qualidade rara em se tratando de arte pública: é infalivelmente divertido. Essa teoria costuma deixar o ex-prefeito Rafael Greca nos cascos. Foi em sua gestão que o eqüino chegou à Garibaldi, com o nobre intuito de louvar as tropeadas. Mas o povo que bate ponto na praça, além de tolerância estética, parece preferir a história contemporânea. “O cavalo é bacana porque baba”, resume o motorista Edimir Nunes de Lima, 36 anos, flagrado com a namorada, na última terça-feira, bem nas barbas do nosso “Gattamelata” – escultura eqüestre de Donatello que inspirou todas as outras. Foi ali, onde a babugem respinga, que Ed desvendou de uma vez por todas o enigma do Babão.

Comentários

Postar um comentário

O que achou desse post? Seu comentário é muito bem-vindo.

Postagens mais visitadas