Demolição de mais um prédio histórico de Curitiba
Passando pela Rua Engenheiros Rebouças vi um cartaz fixado na fachada da antiga sede da Matte Leão do Rebouças que dizia: “Futura Catedral Igreja Universal do Reino de Deus”, junto a uma representação “artística” do que será esse futuro empreendimento.
Não tenho absolutamente nada contra a fé ou a forma de expressar a fé de quem quer que seja, esse é um direito de qualquer pessoa, garantido inclusive pela nossa constituição. O que me causa espanto e tristeza, foi saber que um prédio histórico que deveria ser preservado e adaptado para novas funções, ajudando a resgatar essa região de Curitiba que já foi o centro fabril da cidade, será COMPLETAMENTE destruído para dar lugar a uma edificação nababesca de uma igreja, cuja arquitetura não guarda qualquer relação com a região ou com Curitiba. Aliás, se o terreno fosse no centro de São Paulo, em Salvador, Manaus ou em Paris, o projeto teria o mesmo jeitão: monumental, frio, feito de pedras nobres e sem qualquer identidade.
Li num artigo da Gazeta do Povo de 07/04/2011, assinado por José Carlos Fernandes, que a antiga fábrica da Matte Leão (nas barbas de seu vizinho, a Fundação Cultural de Curitiba, instalada no Moinho Rebouças) começou a ser demolida e com ela, parte importante da memória e da história de Curitiba e do Paraná juntas.
Se o autor não se importar, reproduzo abaixo parte desse artigo, sob o título: “Sem defesa, fábrica da Matte Leão começa a ser demolida.”
Falta de agressividade em preservar memória fabril tira de Curitiba o prédio da empresa que projetou a cidade.
Teve início nesta semana a demolição da sede histórica da Matte Leão S.A, indústria que ocupava mais de um quarteirão na altura das avenidas Getúlio Vargas com João Negrão, no bairro Rebouças, em Curitiba. O terreno de 16,3 mil metros quadrados foi vendido pela família Leão para a Igreja Universal do Reino de Deus, no início de 2010. O valor estimado da transação foi de R$ 32 milhões. No local será construída uma nova Catedral da Fé – a exemplo da erguida pela instituição na Avenida Sete de Setembro.
Para os experts em gestão de patrimônio, a liberação das picaretas vai na contramão das políticas mundiais de preservação da memória fabril, impulsionadas com o crescimento das cidades, diminuição de grandes áreas e ameaças contínuas de especulação imobiliária.
O espaço símbolo de “reciclagem” no Brasil é o Sesc Pompeia, em São Paulo, endereço operário transformado pela arquiteta Lina Bo Bardi em um dos entrepostos culturais da capital. A Matte Leão não teve a mesma sorte, à revelia de ter sido criada em 1901 e do lugar que ocupa no imaginário paranaense. Foi graças ao ciclo da erva-mate que o estado conheceu a pujança econômica e cultural no século 20, do qual os Leão eram símbolos incontestes.
O superintendente estadual do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan, José La Pastina, lembra dos atentados em série à memória fabril em Curitiba, do qual o episódio Matte Leão, reconhece, é um dos mais lastimáveis. Ele cita o desaparecimento das fábricas de massas, como a Todeschini; e as de móveis, como a Cimo. E se confessa pouco otimista. “Eu diria que a proteção fabril estagnou.”
O não reconhecimento da Matte como patrimônio é demanda da fragilidade das políticas de preservação no município. Em vez de tombamento, o Ippuc aplica “alertas” na documentação de imóveis importantes ou os cadastra como “unidades de interesse”, as UIPs. Prédios dessa categoria podem ser alterados, o que não acontece nos tombamentos, desde que com acompanhamento.
A venda da Matte Leão para a Coca-Cola e a transferência da empresa para Fazenda Rio Grande deixou o prédio centenário desprotegido. Ao ser vendido para a Universal, não era unidade de preservação, o que apressou seu destino.
A demolição, por ironia, frustra um projeto da própria prefeitura, pondo à mostra uma contradição do poder público. No início dos anos 2000, a Fundação Cultural (FCC) se mudou para um antigo moinho da Rua Piquiri, como modo de dar impulso ao SoHo Rebouças – projeto de revitalização da área. Incluir a Matte fazia parte dos planos.
Em meio aos impasses, a FCC se manifestou contra a demolição e avalizou o valor arquitetônico de pelo menos parte do prédio, com o qual a igreja poderia conviver sem penitência. Além da fachada da Getúlio Vargas, o historiador Marcelo Sutil, da FCC, destaca os trilhos de trem internos, as estruturas de madeira e os telhados – entre outros elementos passíveis de preservação. O parecer levou o Ippuc a carimbar um alerta na papelada ano passado, mas já era tarde.
Ao pagar R$ 7 milhões a mais do que o avaliado, a Universal ficou com o terreno e com o poder de demolir a fábrica. É o que está fazendo. Incluindo a única parte que o Ippuc recomendou preservar – dois sobrados adendos, na esquina da Piquiri, com influência da arquitetura art déco. A igreja poderia usar dos benefícios dados a quem preserva. Até onde se sabe, dispensou a esmola.
Como já disse em outra oportunidade, Curitiba precisa urgentemente de uma lei de tombamento séria. Sem dúvida é um tema espinhoso, mas que merece atenção, para o bem da memória da nossa cidade.
Nossa, achei ridículo isso...
ResponderExcluirÉ parte da nossa história simplesmente sendo destruída.. Poderiam construir a igreja em qualquer outro lugar da cidade, e na fábrica a prefeitura poderia fazer algum museu do mate, algo assim, porque faz parte da história do Paraná!
Agora só espero que outros edifícios da nossa história não tenham o mesmo destino..
Abraço õ/
Concordo plenamente com o comentário acima!
ResponderExcluirDestruição da história curitibana... Lamentável.
Por essas e outras que deveríamos nos lembrar dos vereadores nos quais votamos para pedir por uma Lei de Tombamento Municipal, antes que a ganancia e o desapego pela nossa cidade destrua o pouco que resta da nossa história! Sei de pessoas na FCC que trabalham há décadas para proteger nosso patrimônio cultural, mas nunca sai do papel.
ResponderExcluirJá era esperado..
ResponderExcluirlamentável, sem comentários.
Fica o protesto
Tenho na minha memória aquele cheiro de mate naquela região.
ResponderExcluiré uma pena. estou longe de Curitiba e cheio de saudades e esta noticia me deixa muito triste .
Tem razão Marco, o cheiro daquela região era muito familiar. Por 6 anos passei por ali praticamente todos os dias de ônibus em direção ao Centro Politécnico.
ResponderExcluirOntem comentei que deveríamos solicitar aos nossos vereadores uma atenção especial para essa questão da proteção do nosso patrimonio cultural. Logo depois, resolvi escrever um e-mail sobre o assunto e enviei para todos os vereadores da câmara de Curitiba (é super fácil, o e-mail de todos eles está disponível no site da casa). Acho que se muitos agirem da mesma forma, talvez funcione. Um dos vereadores (Stica) respondeu e disse que irá estudar o assunto. Achei bastante promissor, pois graças a atuação desse vereador, a Pedreira Paulo Leminski será reaberta. Portanto pessoal, converse com seu vereador ou com todos os vereadores. Creio que o amor e o respeito a Curitiba está acima de divisões partidárias.
ResponderExcluirOlá...gente vcs não imaginam como fiquei triste com esta novidade, meu marido havia me dito que viu uma notícia na TV sobre essa venda, no momento senti um friu na barriga, mas hoje a tarde vi com meus olhos, passamos bem ao lado voltando de um compromisso e lembrei de postar um comentário aqui até pra vc ir fotografar, quando fiquei surpresa ao ver aqui já as fotos do prédio em questão pareceu-me uma espécie de telepatia até, mas não e sim um sentimento que no fundo do coração de tds os Curitibanos nascidos ou adotados por essa cidade maravilhosa, tivemos ao ver tamanho desatino e falta de respeito para com nossos patrimônios e nossa história. Pessoas que deveriam resguardar o passado, nossa cultura que são as coisas mais importantes, não o fazem por pura ganância. Desculpem pelo desabafo, mas ali naquele lugar tenho muitas e ricas lembranças de quando era menina, meus passeios a pé com meus pais, irmãos, titia e avô, aos domingos, fazíamos a volta pela fábrica...é muito triste ainda mais pra quem foi vendida,[NÃO TEM NADA VÊ],não combina, vai ficar fora do contesto, fora de forma, passo errado na dança, fora de cartaz, sem mais palavras...
ResponderExcluirViram que na representação "artística" as árvores não são consideradas? Será que até isso conseguiram comprar? Talvez essas virem tábuas para o piso de alguma sala!! Ah não! Eles usam apenas mármore e granito (provavelmente italianos).
ResponderExcluirHavia inclusive um Pinheiro Araucária, árvore protegida por Lei contra cortes e danos ...
ExcluirOlá...é isso aí pra esse tipo de gente, natureza não faz parte...se duvidar irão sacrificar essas árvores...
ResponderExcluirNunca me esquecerei do cheio de mate tostado dessas ruas curitibanas.
ResponderExcluirNEM EU...
ResponderExcluirOi Lara! Legal a sua frase, cheia de nostalgia. Poderia ser usada num livro.
ResponderExcluirEm uma das disciplinas do meu curso ontem, fora comentado sobre esta demolição, um amigo meu, que me apresentou este blog, me passou o link desta boa postagem, porém que possuiu um fato realmente triste... A demolição deste patrimônio fabril é uma pena, ainda mais em Curitiba, cidade em que sou nativo e ao qual possuía como meu trajeto diário desde que ando de ônibus, tal fachada. A degradação ao qual passou tal obra talvez tenha sido pior que sua demolição, talvez algo do mais terrível para os prédios e fachadas antigas de nossa cidade é não terem mais nada além de pichações como representação de uso, a Matte Leão como este símbolo do início do século passado já não existe mais... Realmente, talvez o que ali tenha sítio, só possa ser resguardado por alguma lei daqui a cem anos,ou não, e vire um estacionamento... Ah, e obrigado pelas fotos, não consegui tirá-las a tempo!
ResponderExcluirOi Eduardo. É de fato triste. Fiz um outro post mostrando o antes e o depois (terra arrasada). Chegou a ver esse?
ResponderExcluirObrigado pela visita!
É triste, muito triste, perceber o quanto a história de um povo é destruída, banalizada, em favor de poucos. Desaparece também a memória de fatos tão importantes que marcaram épocas e pessoas, em favor do "progresso e da comodidade". Fica um grande vazio em nossos olhos e em nossos coracões...
ResponderExcluirPara que a lei de Preservação saia do papel,é preciso pressionar os políticos,e nada melhor que a internet.
ResponderExcluirMinha sugestão, iniciar uma petição no AVAST.ORG.
Fica aqui minha sugestão ao autor e proprietário deste blog,através do AVAST.ORG,já foram ganhas outras causas ai em Curitiba.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirAlém de todas as considerações acima e da evidente perda do remanescente histórico industrial, teremos outra ampla área construída,reduzindo ainda mais o solo livre para absorver as águas da chuva. A região do Rebouças, é uma das áreas mas castigadas da cidade pelas consequências das enchentes, gerando perdas, danos e empobrecimento patrimonial e ambiental.
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