Lívia e os Piá de Prédio
Para os que conhecem, moram ou já moraram em Curitiba, leiam as frases abaixo e digam se estão ou não impregnadas até a alma de Curitiba.
“...porque sou tropeira, eu sou guarani, eu sou estrangeira, eu sou daqui, desço o Itupava, subo o Marumby, 041, eu sou do meio de lugar nenhum...”
“...a mão estendida, um chute na cara... e nunca houve uma mulher como Gilda, um trocado ou um beijo na boca maldita...”
“...eu ando olhando pro chão e mesmo assim eu tropeço e eu não falo com estranhos, eu não aceito nada de ninguém, eu tenho sempre um guarda chuva porque a chuva sempre vem...”
“...as polaquinhas vão levando a caroça com os leite e as verdura pra vender lá na cidade. E é tanta gente diferente rindo junto e cada qual falando de um jeito e vão tentando se entender...”
“...mas fecha o tempo e eu me escondo embaixo do primeiro toldo furado. Eu me rendo à esse inferno/inverno que é um sábado molhado e eu só quero é ir pra casa agora e o ônibus passa lotado. Como pode, um sol tão quente de repente vira céu nublado...”
“...um dia o Bigorrilho virou Champagnat e um dia o Mossunguê virou Ecoville e um dia o Batel virou Soho e um dia a guria virou socialeite. Ela dizia do alto do seu topete: se não tem pão que comam chineques, se não tem água que tomem gengibirra...”
“... a vida era descer o rio de bóia, minha vida era um passeio na feirinha. Hoje isso tudo é só memória, esse interbairros chegou no fim da linha. Chegou o dia em que eu larguei os betes e essa vida me pegou de revesgueio. E eu vou a pé nessa 277, só levo comigo um abraço pro gaiteiro...”
Pois bem, num comentário de um dos meus posts, assinava uma certa Lívia e foi impossível não visitar o blog dela por causa do nome: “Lívia e os Piá de Prédio”, ainda mais no meio das eleições e logo depois do Beto Richa ter sido “acusado” de ser um “Piá de Prédio” pelo seu adversário (“...você pode até tirar o piá do prédio, mas não tira o prédio do piá...”). Para minha grata surpresa, descobri tratar-se de uma banda altamente curitibana, tendo como compositora e letrista a Lívia. Eles já têm dois discos lançados, sendo que o último muito recentemente num show no Sesc da Esquina e de onde saquei algumas frases que iniciaram esse post. Letrista de mão cheia, Lívia desfila referências de Curitiba em todas as músicas, o que nos passa uma sensação de pertencimento.
O sucesso não veio como deveria ainda, mas como numa das letras do primeiro disco: “... nesse submundo autofágico, não tem carona no Balão Mágico. Quem sabe tudo o que você pode querer é estar na capa do Caderno G. Minha foto sorrindo na capa do Caderno G e na edição de domingo...”. Não foi na capa, mas já passaram duas vezes pelo Caderno G (segue link para a resenha do último disco: http://www.gazetadopovo.com.br/colunistas/conteudo.phtml?id=1051552).
Espero que o “Lívia e os Piá de Prédio” tenham vida longa, pois fazem um som de qualidade e que merece ser consumido e admirado por todos (curitibanos autofágicos ou não).
A Lívia muito gentilmente concordou em me passar um breve relato, que reproduzo abaixo, de como tudo aconteceu até aqui.
Nos conhecemos na faculdade. Nos dávamos bem, mas não ficamos bons amigos logo de cara. Com o tempo a gente foi descobrindo que tinha interesses em comum, como a música e a bairrice. Na verdade, em música nós todos concordamos que os Beatles foram os maiores entre os maiores, no resto somos meio diferentes.
Em um festival de rock que fui com o Márcio e uma outra amiga, assistimos ao show do Charme Chulo, que eu considero uma das melhores bandas paranaenses. Eles têm uma música que se chama "O que é que foi, piá”. Ficamos cantarolando, aí começamos a falar dos tipos de piá (de prédio, pançudo, de condomínio...) e no meio do povaréu eu tirei o caderninho e escrevi praticamente inteira a letra de Piá de Prédio. Uns dias depois mostrei pros guris, eles gostaram e resolvemos gravar uma versão bem tosca - eu inclusive caio na risada no meio do refrão. Era pra ser só isso, mas eu estava encasquetada com a idéia de uma banda bairrista. Tinha acabado de voltar de um mini-intercâmbio em Montreal, onde conheci uma banda que se chama Les Cowboys Fringants - que é a maior influência que eu trouxe para a LPP - e queria fazer algo parecido (para ser bem sincera, às vezes sinto que somos uma cópia piorada deles).
Uns dias depois tinha feito Arquitetura, daí Submundo Autofágico, Ferry Boat.... Isso já faz uns quatro, cinco anos. Os piás foram ótimos e toparam tudo, até sugeriram o nome (que eu não gosto muito, mas fica na cabeça das pessoas).
E foi indo aos poucos, demoramos mais de um ano para fazer o primeiro disco, já que só íamos ao estúdio aos sábados de manhã. Gravamos tudo no (rec) áudio, do Bhorel Enrique, que é nosso baterista e um dos primeiros incentivadores que tivemos. Nosso primeiro show foi no aniversário de 315 anos de Curitiba, no salão de festas do prédio do Gustavo ("LPP live from Continentes Building"), depois conseguimos lotar o Teatro Londrina, no Memorial de Curitiba, com boa repercussão na mídia para uma banda com nome tão tosco.
Depois disso tocamos em alguns bares até sermos convidados pelo Abonico Smith para tocar no Curitiba Calling de 2009. Lá conhecemos o Fernando Tupan, que nos convidou para gravar um disco pelo selo dele, o Discos Voadores. Este disco também levou mais de um ano, mas as gravações em si foram rápidas. No meio tempo fizemos o Acústico Mundo Livre a convite da Marielle Loyola e passamos no edital Som da Cidade, do Sesc da Esquina, que coincidiu com o lançamento do Bloco II.
Olha só que coincidência: eu morei na torre em primeiro plano (edifício Galileu), primeiro no 233, composto pelas três janelas da direita, as terceiras de cima para baixo. Depois morei no 123, na mesma posição, cujas janelas não aparecem aqui por estarem atrás das árvores. Meu primeiro filho nasceu em Curitiba e viveu seu primeiro ano nesse 123, antes de eu vir embora para Campinas.
ResponderExcluirQue legal! Esses prédios são imponentes no Alto da XV. O Conjunto Cosmos é um importante exemplo da Arquitetura Modernista de Curitiba (Jaime Wassermann foi o arquiteto).
ResponderExcluirRapaz tu deveria criar uma revista em Curitiba, as coisas que tu traz neste blog sao de uma competência histórica de uma identificação. Teus posts nos dão identidade legitimidade, nos dão uma cara e um endereço ...
ResponderExcluirOi Yvana. Muito obrigado pelo comentário e por gostar do blog. Tenho tentado fazer um registro do meu tempo nessa cidade que sempre amei, mesmo antes de me mudar para cá.
ResponderExcluirQuanto a uma revista ou valor histórico dos meus registros, acho que fica um pouco fora do meu alcance. Me considero mais um compilador de fatos (de fontes confiáveis ou nao, hehe que procuro para acompanhar as minhas fotos (essas sim, tento trabalhar para que fiquem cada vez menos piores).
Mais uma vez, obrigado pela sua visita, recomende para seus amigos e se tiver sugestões do que eu possa fotografar, me avisa!
Abraco.
Olá Washington,
ResponderExcluirGostaria de saber o título da música da LPP que tem o seguinte trecho:
".um dia o Bigorrilho virou Champagnat e um dia o Mossunguê virou Ecoville e um dia o Batel virou Soho e um dia a guria virou socialeite. Ela dizia do alto do seu topete: se não tem pão que comam chineques, se não tem água que tomem gengibirra"
Muito Obrigada,
Ana
Oi Ana. O nome dessa música eh Socialeite. Essa esta no segundo disco da LPP (Bloco II). Abraco.
ResponderExcluirWashington